No terceiro trimestre de 2020, o desemprego atingiu atingiu a maior taxa já registrada no país, o que fez o empreendedorismo disparar no Brasil como alternativa durante a crise. Mas além dos índices de desemprego serem maiores para mulheres do que para homens, aquelas que querem se tornar empreendedoras também enfrentam mais obstáculos, segundo especialistas.
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o desemprego no Brasil saltou para uma nova taxa recorde de 14,6% no trimestre encerrado em setembro. Com isso, são 14,1 milhões de brasileiros desempregados, sendo que menos da metade da população em idade para trabalhar está ocupada.
Além disso, os dados do IBGE indicam um cenário pior para as mulheres. Enquanto a taxa de desemprego no terceiro trimestre foi de 12,8% entre homens, o índice entre mulheres foi de 16,8%.
E se a alternativa encontrada para fugir do desemprego for abrir um negócio próprio, a pesquisa “O Impacto da Pandemia do Coronavírus nos Pequenos negócios” revela que mulheres empreendedoras ainda sentem constrangimento ao pedir empréstimos aos bancos. O estudo é realizado pelo Sebrae em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Para Marisa Cesar, CEO do Grupo Mulheres do Brasil, que promove ações para estimular o protagonismo feminino, isso se trata de uma questão cultural. Ela destaca que as mulheres são ensinadas a duvidar do seu próprio potencial, enquanto os homens são incentivados a confiar em suas capacidades e projetos.
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Segundo Marisa, essa situação faz com que falte confiança para muitas mulheres que pretendem abrir um negócio. Com isso, elas deixam de pedir empréstimos maiores pelo receio de passar vergonha, acreditando que não terão pontuação suficiente para solicitar o crédito que necessitam.
Ela prefere pedir valor menor, para não passar vergonha, como se fosse ficar um carimbo nela. Isso é interessante, porque o homem, ele pede o que tiver que pedir e, se não der, paciência. É toda uma questão de como somos educadas, por conta do machismo”, afirma a executiva.
Marisa explica que as demandas das mulheres que buscam empreender variam conforme o perfil de cada uma. Segundo a CEO, algumas delas precisam de capacitação e orientação sobre questões como estratégias de marketing e a necessidade de separação entre finanças pessoais e o dinheiro destinado ao negócio.
Entretanto, Marisa destaca que não são apenas as mulheres com condições socioeconômicas mais limitadas que enfrentam dificuldades. Ela ressalta que mesmo aquelas que dispõem de mais recursos para investir encontram diversos obstáculos impostos pelo machismo. “A gente já assistiu a muitas cenas em que ocorre um divórcio e o marido acaba pegando o negócio dela e levando embora com ele”, conta.
Além disso, Marisa ainda destaca a questão do racismo, que faz com que mulheres negras tenham o “dobro ou o triplo” de desconfiança para seguir com seus projetos.
De acordo com um levantamento do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) sobre a desigualdade entre brancos e negros durante a pandemia, a taxa de desocupação deste grupo populacional superou a de qualquer outros nos dois primeiros trimestres de 2020. No primeiro, o índice chegou a 17,3%, e no segundo cresceu para 18,2%.
Mulheres empreendedoras também têm mais dificuldade para se recuperar
Outro problema que afeta mais as mulheres do que os homens é a dificuldade de recuperação diante da crise. O receio diante das instituições de crédito pode ser uma das explicações para essa questão.
Em relação às perdas, o índice de mulheres empreendedoras que ainda registravam queda no faturamento em outubro era de 77%, segundo a pesquisa do Sebrae e da FGV. Entre os homens, o percentual era de 73%. Em abril, seis meses antes da pesquisa, o índice era de 89% para ambos os grupos.
Mas um estudo do Sebrae em parceria com o Banco Mundial sugere que as mulheres empreendedoras evitaram repassar os prejuízos para os funcionários. Além disso, elas também se mostraram mais dispostas a adotar os protocolos sanitários recomendados pelas autoridades, e a adotar políticas públicas de amenização dos impactos da crise.
Segundo Carolina Fabris, coordenadora de pesquisas do Sebrae-SP, esses dados podem indicar que mulheres empreendedoras são mais resilientes e cuidadosas com o próximo. Para ela, o fato de mulheres gastarem mais tempo com afazeres domésticos do que homens também pode afetar o desempenho dos negócios por ela comandados.
Para a realização da pesquisa, foram analisadas 1.677 micro e pequenas empresa do estado de São Paulo.